Thursday, 14 June 2007

Bye Bye London...e as pipocas, hein?

Acabou a minha última visita a Londres. Ou pelo menos durante a minha estadia erásmica...Foi um passeio só para meninas que começou logo mal, pois a Claire, que é despistada, conseguiu perder o seu bilhete de autocarro no Sainsburys, ainda a caminho da estação...Depois quando chegámos a Londres verificámos que era fim-de-semana seguido de feriado, para além de haver um jogo de futebol qualquer, demorámos uns bons 45minutos só para comprar os bilhetes, juro que havia uma concentração média de seis pessoas por metro quadrado, excepto em cima dos meus pobres pés, onde eram 7. Porque é que quando alguém me pisa nunca é uma fada a usar sabrinas, tem de ser sempre uma rinoceronta de saltos de agulha e leggins cor de rosa choque que nem sequer tem a delicadeza de resmungar o habitual Sorry’bou’dat. Resumindo, há alturas melhores para andar no metro de Londres, até a pessoa mais santa e paciente (que não sou eu, obviamente) ficaria com agressões após os primeiros minutos de estar entalada entre dois ingleses vermelhos, suados, e vestidos com as cores de sabe Deus que equipa...E apanho sempre o lugar vago debaixo do sovaco de um deles, lugar este que estivera vago por uma razão. A falta de espaço até tinha um efeito wonderbra, estreitando a cintura e levantando os seios, mas infelizmente só dura enquanto se está dentro do metro, pois quando estalámos porta fora que nem tremoços, em Green Park, voltámos às nossas silhuetas naturalmente humanas... A dada altura, bastante no início da aventura, a Claire, que é despistada foi separada de mim e da Gina pelo destino na forma de duas portas automáticas que se fecharam sob a voz divina que exclamava “Mind the Gap”, sem se preocupar com os pobres mortais separados e perdidos devido à sua acção. Lá fomos então até Oxford Circus, onde esperámos a Claire na plataforma, entristecidas pleo facto de ela não vir a bordo do metro seguinte, nem do seguinte depois do seguinte, nem do seguinte depois do seguinte depois do seguinte, lamentavelmente. Combinámos então que eu ficaria ali mesmo sem me mexer, com um aspecto grande e bem visível, caso a despistada ainda aparecesse, enquanto a Gina, que devido à sua reduzida estatura física não serve como ponto de encontro, iria tentar telefonar-lhe.

Esperei uma eternidade, com certeza quase dez minutos, e depois cheguei à conclusão que me tinham abandonado, e que não era justo, e que eu também teria o direito de me perder, afastando-me por isso do único ponto em Londres onde haveria uma chance remota de vir a ser encontrada. A meu único consolo era que eu, devido ao meu nível hierárquico elevado (Boss), era a detentora de todos os bilhetes para Bristol...Sem mim nada funciona!

Subi e desci alegremente todas as escadas rolantes que encontrei, sem nunca me aventurar até aos locais onde já se apanha rede, e acocorando-me cada vez que via alguém parecido à Gina. Pelo menos foi isso que a Gina pensou que eu estaria a fazer, a julgar pelo tom acusativo com que me perguntou onde é que eu me tinha enfiado, quando finalmente me conseguiu telefonar.

Tudo está bem quando acaba bem, reencontrámo-nos graças aos telemóveis e seguimos para Camden, onde comprei o boomerang que o meu respectivo desejava, não um qualquer, mas sim um para dextros e amarelo! Esta especificação cromática é particularmente importante, prendendo-se com uma razão muito técnica. Quando lhe perguntei porquê amarelo respondeu-me: “Porque gosto de amarelo.”Ora toma.

Comemos um caril óptimo, não comprámos 5 casacos de cabedal, embora só custassem 10 pounds, não comprámos bijutaria nenhuma para nós próprias, só para amigas, não furámos nenhuma parte da nossa anatomia, nem nos apaixonámos por nenhum punk.

A seguir estava na hora de alguma cultura, ao que a Gina sumiu para se encontrar com um amigo, e sobrámos só eu e a despistada para atacar o museu britânico, onde vi o famoso Rosetta Stone, que foi a chave que levou Champollion a decifrar os hieróglifos, uma vez que tem a mesma inscrição em três línguas diferentes, hieroglifos egípcios, egípcio demótico, e grego clássico. A inscrição é um decreto sobre a construção de monumentos e edifícios no reinado de Ptolmeu V, em 196 a.C. É incrível a minúcia e o minuto tamanho das inscrições, são mais ou menos a tamanho 20 no PC: Assim. Também vimos muitas múmias muito pouco apetitosas e inúmeros artefactos de barro desde os primórdios da olaria.

Depois perdemos quase o resto da tarde a tentar comprar uma camisola para a Claire, pois ela é, como penso já ter mencionado, uma despistada, e andava de top+blazerzinho de algodão.

Jantámos no Pizzahut, o Feast for Four, apesar de sermos só duas e meia e quase rebentámos. Infelizmente não pudemos ir ver um musical (queria tanto ver o Dirty Dancing) pois custavam nada mais nada menos que 50libras por bilhete, 35 no melhor dos casos. E não consegui comprar os meus queridos côcos juvenis, que já sei abrir tão bem...o supermercado chinês já estava fechado quando lá chegámos, frustração. Quando for a Florianópolis, (aka “Floripa”, para os nativos) visitar a Camila, hei-de tomar água de côco todos os dias. E as meninas gozaram comigo e a minha demanda dos santos côcos.

Dia 29 de Maio

Acabei o exame mais difícil que tinha para fazer, Rhythm and Rhymes, uma sala cheia de nativos, e duas horas para escrever o máximo possível numa língua que não é a minha primeira língua...Escrevi oito páginas, o dedo até ganiu, e no fim tinha uma cova por cima da articulações da falanginha do dedo médio. Estão a ver onde é? Mas acho que me portei bem. A Lydia, que ficou sentada atrás de mim disse que tinha achado fascinante a velocidade e determinação com que eu escrevia em inglês, deve ter ficado a pensar que em português ainda sou mais rápida...o que não é o caso.

Aproveitei o serão a ver uma das grandes produções cinematográficas do século XXI. Mentira, foi o filme Bend it like Beckham, uma comédia anglo-indiana que dá para rir e não faz mal a ninguém. Não se deve subestimar o valor de um filme que nos faça rir e sentir bem, digo-o especialmente a mim mesma, pois há uns dias atrás resolvi deixar de ser fútil e main-stream, e trouxe dois terríveis DVD’s da biblioteca, um filme francês chamado “L’Enfer”, que era uma história de um maníaco-ciumento, e outro iraquiano, aliás um dos poucos filmes feitos no Iraque depois da queda do Regime de Saddam Hussein, e que tinha o nome inocente “Turtles can fly”, Tartarugas conseguem voar. Foi horrível, especialmente este último, pelo seu extremo realismo. Retratava a vida de um grupo enorme de miúdos órfãos, quase todos mutilados de uma forma ou de outra, devido
à maneira como ganhavam a vida: recolhendo minas dos campos de agricultores. A estes juntam se três irmãos curdos, ou assim pensamos, pois são um rapaz de cerca 14 anos, uma menina de 11/12 e um bebé de dois. Descobre-se então que a menina tinha sido violada pelos soldados de Saddam, sendo que o bebé é o fruto desse crime, razão pela qual ela o detesta. Muito duro, com um final triste, deixa-nos sem vontade nenhuma de ter filhos.

Logo cheguei à conclusão que prefiro filmes intelectualmente menos valiosos, mas igualmente intelectualmente menos masoquistas, pois a maior parte das vezes não me apetece nada uma depressão artificialmente induzida, por muito realista que seja.

Uma das minhas descobertas mais recentes foram as pipocas microondáveis, que eu já tinha visto, mas nunca comprado. Sou daquelas pessoas à antiga que ainda escreve uma carta, sabe fazer raviolis à mão, e orgulha-se de nunca ter comprado uma refeição pré-cozinhada. ( pausa para re-avaliação desta afirmação...será que não minto?) Tirando uma lata de esparguete com molho, quando fui acampar à Serra da Estrela, mas acho que não conta pois não o comi. Era nojento, e alimentei um co-acampante com ele.

Sempre tinha feito as minhas próprias pipocas, com o milho dentro de um tacho, o molho de caramelo à parte, etc, mas aqui na cozinha comum, com os terríveis fogões eléctricos, optei por experimentar. Por acaso é das coisas que mais me “dão galo, e um galo galeoso”, como dizia o meu pai, são estes pseudo-fogões. Até tiram a vontade de cozinhar. Fogão que é fogão quando-se liga, está quente, quando se desliga, está desligado. Não é meia hora de preparação para cada estado...

Mas divago: voltemos às pipocas. Eu adoro pipocas. E não como pessoas normais, eu sou uma máquina de comer pipocas. Acho que é das poucas coisas em mim que irritam o Filipe a ponto de lhe apetecer dar-me caldos. Se eu tenho um saco de pipocas à frente deixo de ver, de ouvir, de falar com clareza, e a minha mão move-se com uma velocidade estonteante e ritmada entre saco e boca até deixar de haver. Até como os milhozinhos duros no fundo do saco, que o comum mortal usa para arremessar à cabeça do próximo, quando está no cinema, ou do gajo chato da carapinha à la Jimmi Hendrix, que passou o filme todo a tapar o ecrã...E se porventura sobrar uma mão cheia delas, guardo-as para o dia seguinte e como-as com mais gosto ainda, moles e borrachosas. Mas isto deve ser genético, pois o meu irmão mais velho espalha as bolachas em cima do frigorífico, para ficarem moles, antes de as comer.

Mas o ponto do meu discurso era mesmo: O efeito de pipocas e cereais estaladiços na comunicação global. Uma breve reflexão por S.L. Fechner.

Logo de antemão posso dizer que o efeito é negativo. As pipocas e a televisão põe sérios entraves na capacidade do ser humano de se relacionar coerentemente com o próximo, e de travar aquilo que se chama o diálogo, e que aparece em oposição drástica ao monólogo chato, que é uma doença que aflige muita gente, manifestando-se na obstinada insistência em falar, falar, falar de si mesmo ignorando o facto óbvio de que ninguém está interessado. Essa actividade as pipocas não impedem, pelo contrário, abafam um pouco o ruído aborrecido. Mas a conversa verdadeira que implica locutor e interlocutor interessado e activo, essa sim as pipocas travam. Para já, deixo de conseguir articular com clareza, sem mandar chuviscos de milho e partículas brancas, o que em si é uma enorme perda para o mundo, (obviamente), e ainda por cima deixo de ouvir, logo as respostas pouco nítidas e coríscadas que dou são, a maior parte das vezes, incoerentes e despropositadas...Oiço em grande volume Crunch, crucnch, crunch, glup, nhoc, crunch, e respondo a perguntas simples como “a que horas acaba isso (a Oprah)?” com divagações sobre educação canina e os seus variados métodos, porque percebi “achas que está muito submisso?”....Agora imagine-se a catástrofe global que se daria se na cimeira do G8 este efeito nocivo se tivesse manifestado entre os líderes das nações industrializadas...a julgar pelas decisões que tomaram, pelo menos algumas pipocas estiveram, com certeza, envolvidas.