Thursday, 14 June 2007

Bye Bye London...e as pipocas, hein?

Acabou a minha última visita a Londres. Ou pelo menos durante a minha estadia erásmica...Foi um passeio só para meninas que começou logo mal, pois a Claire, que é despistada, conseguiu perder o seu bilhete de autocarro no Sainsburys, ainda a caminho da estação...Depois quando chegámos a Londres verificámos que era fim-de-semana seguido de feriado, para além de haver um jogo de futebol qualquer, demorámos uns bons 45minutos só para comprar os bilhetes, juro que havia uma concentração média de seis pessoas por metro quadrado, excepto em cima dos meus pobres pés, onde eram 7. Porque é que quando alguém me pisa nunca é uma fada a usar sabrinas, tem de ser sempre uma rinoceronta de saltos de agulha e leggins cor de rosa choque que nem sequer tem a delicadeza de resmungar o habitual Sorry’bou’dat. Resumindo, há alturas melhores para andar no metro de Londres, até a pessoa mais santa e paciente (que não sou eu, obviamente) ficaria com agressões após os primeiros minutos de estar entalada entre dois ingleses vermelhos, suados, e vestidos com as cores de sabe Deus que equipa...E apanho sempre o lugar vago debaixo do sovaco de um deles, lugar este que estivera vago por uma razão. A falta de espaço até tinha um efeito wonderbra, estreitando a cintura e levantando os seios, mas infelizmente só dura enquanto se está dentro do metro, pois quando estalámos porta fora que nem tremoços, em Green Park, voltámos às nossas silhuetas naturalmente humanas... A dada altura, bastante no início da aventura, a Claire, que é despistada foi separada de mim e da Gina pelo destino na forma de duas portas automáticas que se fecharam sob a voz divina que exclamava “Mind the Gap”, sem se preocupar com os pobres mortais separados e perdidos devido à sua acção. Lá fomos então até Oxford Circus, onde esperámos a Claire na plataforma, entristecidas pleo facto de ela não vir a bordo do metro seguinte, nem do seguinte depois do seguinte, nem do seguinte depois do seguinte depois do seguinte, lamentavelmente. Combinámos então que eu ficaria ali mesmo sem me mexer, com um aspecto grande e bem visível, caso a despistada ainda aparecesse, enquanto a Gina, que devido à sua reduzida estatura física não serve como ponto de encontro, iria tentar telefonar-lhe.

Esperei uma eternidade, com certeza quase dez minutos, e depois cheguei à conclusão que me tinham abandonado, e que não era justo, e que eu também teria o direito de me perder, afastando-me por isso do único ponto em Londres onde haveria uma chance remota de vir a ser encontrada. A meu único consolo era que eu, devido ao meu nível hierárquico elevado (Boss), era a detentora de todos os bilhetes para Bristol...Sem mim nada funciona!

Subi e desci alegremente todas as escadas rolantes que encontrei, sem nunca me aventurar até aos locais onde já se apanha rede, e acocorando-me cada vez que via alguém parecido à Gina. Pelo menos foi isso que a Gina pensou que eu estaria a fazer, a julgar pelo tom acusativo com que me perguntou onde é que eu me tinha enfiado, quando finalmente me conseguiu telefonar.

Tudo está bem quando acaba bem, reencontrámo-nos graças aos telemóveis e seguimos para Camden, onde comprei o boomerang que o meu respectivo desejava, não um qualquer, mas sim um para dextros e amarelo! Esta especificação cromática é particularmente importante, prendendo-se com uma razão muito técnica. Quando lhe perguntei porquê amarelo respondeu-me: “Porque gosto de amarelo.”Ora toma.

Comemos um caril óptimo, não comprámos 5 casacos de cabedal, embora só custassem 10 pounds, não comprámos bijutaria nenhuma para nós próprias, só para amigas, não furámos nenhuma parte da nossa anatomia, nem nos apaixonámos por nenhum punk.

A seguir estava na hora de alguma cultura, ao que a Gina sumiu para se encontrar com um amigo, e sobrámos só eu e a despistada para atacar o museu britânico, onde vi o famoso Rosetta Stone, que foi a chave que levou Champollion a decifrar os hieróglifos, uma vez que tem a mesma inscrição em três línguas diferentes, hieroglifos egípcios, egípcio demótico, e grego clássico. A inscrição é um decreto sobre a construção de monumentos e edifícios no reinado de Ptolmeu V, em 196 a.C. É incrível a minúcia e o minuto tamanho das inscrições, são mais ou menos a tamanho 20 no PC: Assim. Também vimos muitas múmias muito pouco apetitosas e inúmeros artefactos de barro desde os primórdios da olaria.

Depois perdemos quase o resto da tarde a tentar comprar uma camisola para a Claire, pois ela é, como penso já ter mencionado, uma despistada, e andava de top+blazerzinho de algodão.

Jantámos no Pizzahut, o Feast for Four, apesar de sermos só duas e meia e quase rebentámos. Infelizmente não pudemos ir ver um musical (queria tanto ver o Dirty Dancing) pois custavam nada mais nada menos que 50libras por bilhete, 35 no melhor dos casos. E não consegui comprar os meus queridos côcos juvenis, que já sei abrir tão bem...o supermercado chinês já estava fechado quando lá chegámos, frustração. Quando for a Florianópolis, (aka “Floripa”, para os nativos) visitar a Camila, hei-de tomar água de côco todos os dias. E as meninas gozaram comigo e a minha demanda dos santos côcos.

Dia 29 de Maio

Acabei o exame mais difícil que tinha para fazer, Rhythm and Rhymes, uma sala cheia de nativos, e duas horas para escrever o máximo possível numa língua que não é a minha primeira língua...Escrevi oito páginas, o dedo até ganiu, e no fim tinha uma cova por cima da articulações da falanginha do dedo médio. Estão a ver onde é? Mas acho que me portei bem. A Lydia, que ficou sentada atrás de mim disse que tinha achado fascinante a velocidade e determinação com que eu escrevia em inglês, deve ter ficado a pensar que em português ainda sou mais rápida...o que não é o caso.

Aproveitei o serão a ver uma das grandes produções cinematográficas do século XXI. Mentira, foi o filme Bend it like Beckham, uma comédia anglo-indiana que dá para rir e não faz mal a ninguém. Não se deve subestimar o valor de um filme que nos faça rir e sentir bem, digo-o especialmente a mim mesma, pois há uns dias atrás resolvi deixar de ser fútil e main-stream, e trouxe dois terríveis DVD’s da biblioteca, um filme francês chamado “L’Enfer”, que era uma história de um maníaco-ciumento, e outro iraquiano, aliás um dos poucos filmes feitos no Iraque depois da queda do Regime de Saddam Hussein, e que tinha o nome inocente “Turtles can fly”, Tartarugas conseguem voar. Foi horrível, especialmente este último, pelo seu extremo realismo. Retratava a vida de um grupo enorme de miúdos órfãos, quase todos mutilados de uma forma ou de outra, devido
à maneira como ganhavam a vida: recolhendo minas dos campos de agricultores. A estes juntam se três irmãos curdos, ou assim pensamos, pois são um rapaz de cerca 14 anos, uma menina de 11/12 e um bebé de dois. Descobre-se então que a menina tinha sido violada pelos soldados de Saddam, sendo que o bebé é o fruto desse crime, razão pela qual ela o detesta. Muito duro, com um final triste, deixa-nos sem vontade nenhuma de ter filhos.

Logo cheguei à conclusão que prefiro filmes intelectualmente menos valiosos, mas igualmente intelectualmente menos masoquistas, pois a maior parte das vezes não me apetece nada uma depressão artificialmente induzida, por muito realista que seja.

Uma das minhas descobertas mais recentes foram as pipocas microondáveis, que eu já tinha visto, mas nunca comprado. Sou daquelas pessoas à antiga que ainda escreve uma carta, sabe fazer raviolis à mão, e orgulha-se de nunca ter comprado uma refeição pré-cozinhada. ( pausa para re-avaliação desta afirmação...será que não minto?) Tirando uma lata de esparguete com molho, quando fui acampar à Serra da Estrela, mas acho que não conta pois não o comi. Era nojento, e alimentei um co-acampante com ele.

Sempre tinha feito as minhas próprias pipocas, com o milho dentro de um tacho, o molho de caramelo à parte, etc, mas aqui na cozinha comum, com os terríveis fogões eléctricos, optei por experimentar. Por acaso é das coisas que mais me “dão galo, e um galo galeoso”, como dizia o meu pai, são estes pseudo-fogões. Até tiram a vontade de cozinhar. Fogão que é fogão quando-se liga, está quente, quando se desliga, está desligado. Não é meia hora de preparação para cada estado...

Mas divago: voltemos às pipocas. Eu adoro pipocas. E não como pessoas normais, eu sou uma máquina de comer pipocas. Acho que é das poucas coisas em mim que irritam o Filipe a ponto de lhe apetecer dar-me caldos. Se eu tenho um saco de pipocas à frente deixo de ver, de ouvir, de falar com clareza, e a minha mão move-se com uma velocidade estonteante e ritmada entre saco e boca até deixar de haver. Até como os milhozinhos duros no fundo do saco, que o comum mortal usa para arremessar à cabeça do próximo, quando está no cinema, ou do gajo chato da carapinha à la Jimmi Hendrix, que passou o filme todo a tapar o ecrã...E se porventura sobrar uma mão cheia delas, guardo-as para o dia seguinte e como-as com mais gosto ainda, moles e borrachosas. Mas isto deve ser genético, pois o meu irmão mais velho espalha as bolachas em cima do frigorífico, para ficarem moles, antes de as comer.

Mas o ponto do meu discurso era mesmo: O efeito de pipocas e cereais estaladiços na comunicação global. Uma breve reflexão por S.L. Fechner.

Logo de antemão posso dizer que o efeito é negativo. As pipocas e a televisão põe sérios entraves na capacidade do ser humano de se relacionar coerentemente com o próximo, e de travar aquilo que se chama o diálogo, e que aparece em oposição drástica ao monólogo chato, que é uma doença que aflige muita gente, manifestando-se na obstinada insistência em falar, falar, falar de si mesmo ignorando o facto óbvio de que ninguém está interessado. Essa actividade as pipocas não impedem, pelo contrário, abafam um pouco o ruído aborrecido. Mas a conversa verdadeira que implica locutor e interlocutor interessado e activo, essa sim as pipocas travam. Para já, deixo de conseguir articular com clareza, sem mandar chuviscos de milho e partículas brancas, o que em si é uma enorme perda para o mundo, (obviamente), e ainda por cima deixo de ouvir, logo as respostas pouco nítidas e coríscadas que dou são, a maior parte das vezes, incoerentes e despropositadas...Oiço em grande volume Crunch, crucnch, crunch, glup, nhoc, crunch, e respondo a perguntas simples como “a que horas acaba isso (a Oprah)?” com divagações sobre educação canina e os seus variados métodos, porque percebi “achas que está muito submisso?”....Agora imagine-se a catástrofe global que se daria se na cimeira do G8 este efeito nocivo se tivesse manifestado entre os líderes das nações industrializadas...a julgar pelas decisões que tomaram, pelo menos algumas pipocas estiveram, com certeza, envolvidas.

Monday, 28 May 2007

Ireland...a ilhota verdinha.

Dia 23 de Maio de 2007

Amanhã são os anos do Ivo, e, uma vez na vida, enviei o que tinha a enviar com a devida antecedência, de modo a que não me preciso preocupar...chega a horas sim.

Está feita a minha última viagem significante antes de voltar à pátria...Acabei de despedir a Catarina, que volta amanhã de manhã para Portugal. Ela foi a minha companheira de viagem nestes dois dias na Irlanda.

Saímos pelas 5:30 da manhã aqui de Clifton, e por volta das 9:00 horas já estávamos em Dublin airport. O voo é muito curto, mas há que ressaltar que os aviões da Ryanair ao aterrar fazem um barulho verdadeiramente assustador, VROOOOOOOOUUUUM, parece que vão rebentar a qualquer instante, depois de os pneus se pulverizarem por completo, alias, como diz a Catarina, é a EXPL, só fica a faltar o OSÃO final.

Como somos meninas minimamente inteligentes já tínhamos descoberto, via net, qual o autocarro a tomar, era o 41, para o city centre. Como a inteligência se fica pelo mínimo, no entanto, acabámos por tomar o 41 para cú de judas...mas a determinada altura, antes de chegar a Belfast, lá notámos. Mais uma vez nos valeu o mínimo. (de inteligência). Uma vez apanhado o veículo certo, adormeci de alivio, deixando a minha camarada com a árdua tarefa de manter os olhinhos dela abertos para não falharmos a paragem, enquanto eu cabeceava e babava toda consolada.

A primeira descoberta que fizemos no país dos Leprechauns e dos trevos, é que os marcos do correio são verdes, em oposição aos característicos marcos vermelhos da ilhota monárquica; e que é caro como tudo. Ainda consegue ser “mais pior mau” que a Inglaterra, parece-me. Ou então foi de ver euros de novo, e já não estar habituada. Uma garrafa de água não se arranjava a menos de 2.20€, e o cúmulo foi mesmo a usura que sofremos no posto de turismo, onde por um mapa da cidade, impresso numa folha A4, pediam 1 euro! Que descaramento! E nem tinha monumentos nenhuns assinalados! Em Cornwall foi tudo de graça e com muito mais simpatia. Acho mal. Acabámos por comprar um mapinha um pouco mais sofisticado, que custou 2€, mas só por embirrância roubei o de 1€. Que é para não serem assim. Ainda apanhei um cagaço quando a senhora da caixa veio a correr atrás de nós aos gritos (consciência de criminosa), mas tratava-se simplesmente da minha garrafa de água cara, da qual me tinha esquecido.

Depressa descobrimos que Dublin não é uma cidade que prima pelos seus ex-libris inconfundíveis, tirando talvez a cerveja Guiness, cuja publicidade omnipresente realmente chega a ser poluição visual, e invasão do espaço óptico. Quase ficámos ocularmente bêbedas.

Seguimos então o nosso mapa, tentámos ver o máximo possível de atracções turísticas, sendo que uma que me interessava realmente nos escapou: queria ter ido ver a múmia extremamente bem conservada do “Bog man”, encontrada nos pantanais de turfa. Se fôr a que eu estou a pensar, usa umas botas caneleiras em estado admirável, que de resto dariam para pedir emprestadas e calçar na rua sem que ninguém achasse estranho, de tão boas que estão. Infelizmente o respectivo museu encerra às segundas-feiras. Privaram-me de me aculturar, e por arrastamento, de vos aculturar a vós!

Vimos portanto Trinity College, que é a universidade; Dublin Castle, que foi a sede do poder inglês na Irlanda (pequena reflexão à parte, se eu quisesse escrever “sede” - de beber - , do poder inglês, como o faria??? A acentuação tuga deixa a desejar...) por sete séculos, até à independência em 1923; e St.Patrick’s Cathedral, uma catredral que muito contribuiu para a vida e cultura irlandesas. Reza a lenda que St.Patrick teria baptizado recém-conversos num poço que fica num parque ao lado da catedral, tendo por isso existido uma igreja no local, desde pelo menos o século V. Os normandos construíram a primeira igreja de pedra em 1191, que foi reconstruída no século XIII, mantendo-se muito semelhante ao que vemos hoje.

Jonathan Swift foi lá dean desde 1713-45, supostamente enquanto não estava ocupado a congeminar “As viagens de Gulliver”, e foi também nesta igreja que o “Messias” de Händel foi pela primeira vez cantado para o público, na Irlanda, uma performance que reuniu os coros de St.Patrick’s e também de Christchurch Cathedral. Esta última é dos edifícios mais antigos de Dublin, e tendo sido fundada em 1038 por Vikings é a única catedral no todo de Inglaterra e Irlanda que tem fundamentos nórdicos.

No interior da catedral pode-se ver, entre outras outras coisas o túmulo de Strongbow, o líder dos normandos que capturaram Dublin em 1170.

Prestadas as honras à cultura secular entrámos então em algumas das abundantes lojinhas verdejantes de trevos e leprechauns, que armadilham as ruas, nas quais comprámos alguns postais e outras porcarias que ninguém precisa na realidade, e que se transformam em quinquilharias embaraçosas assim que se chega a casa, mas que na altura parecem maravilhosamente típicas. Abestive-me de comprar um chapéu verde monstruoso, e também não tenho um porta chaves a dizer Kiss My Ass em Gaelico – sou uma heroína!

Seguimos caminho à procura de uma exposição sobre Vikings que era suposto existir num determinado ponto do mapa, o que se revelou uma mentira fedorenta, pois o maldito papelucho apesar de ter custado dois euros nem por isso tinha sido actualizado desde os tempos de vida de Gutenberg, mais ou menos, tendo a exposição em causa fechado há cerca de 7(!!!) anos...mas felizmente tinha aberto uma nova, num sitio diferente, à qual nos dirigimos e decidimos entrar, apesar de custar 5€. É que já nos escasseavam coisas para fazer e de qualquer modo eu tenho um certo fascínio pelos Vikings, que o Filipe desconfia provir somente do facto de serem grandes e loiros (na volta é verdade), que não perdia nada em ser colorido com algumas informações históricas.

A exposição começava com uma parte sobre o passado medieval de Dublinia, de onde deriva Dublin, nome inglês e internacional, que no entanto não é o mais antigo, uma vez que o aglomerado de habitações inicial, que remota a tempos pré-históricos tinha o fantástico nome de Áth Cliath, que em irlandês moderno é Baile Átha Cliath...não admira que seja Dublin para os amigos estrangeiros. Dubhlinn queria dizer “Poça escura”, e quando os Vikings tomaram a cidade e a baía corromperam a palavra para Dyflinn, sendo este o nome que aparece nas sagas islandesas.

Achei bastante interessante a parte da exposição dedicada aos barcos Viking: a própria palavra Viking, (que geralmente se usa para descrever os povos nórdicos da mesma época histórica, provenientes da actual escandinávia), inicialmente queria dizer pirata, alguém que navegava para conseguir espojos, saíndo de uma baía (Vik) para atacar: um Vikingr.

Os barcos foram a chave para o successo e a rápida expansão destes guerreiros guedelhudos, conseguindo cobrir cerca de 190Kms em 24 horas. Geralmente não levavam mais de 32 remadores, e uma réplica de um barco Viking encontrado em Gokstad fez a travessia entre a Noruéga e a Terra Nova em 4 semanas. Nada mau...

Levo também um grave corte no arquétipo dos capacetes cornudos, que nada mais são senão um engano histórico, sendo usados por povos pré-vikings em certas cerimónias místicas, mas nunca por Vikings...e eu que já tinha os chifres de vaca para o próximo carnaval...

Acabámos o dia passeando por O’Connel Street, e a fazer umas comprinhas muito económicas, para podermos fazer o esparguete com molho de frasco da praxe, e mais umas coisas para fazermos as sanduiches que nos sustentaram ao longo dos dois dias. Atum e paté, para mim, atum com atum e atum e um bocadinho de milho para a Catarina...que enjoo.

No Shining Hostel, que fica em Marlborough Street, os computadores estavam avariados, não havia lençóis (deram nos capas de edredão, como substituto) e não sabiam o que eram panos de cozinha. Ah, e estava invadido de brasileiros que pareciam ser pagos por olhar de olhos esbugalhados para quem chegava, enquanto ateimavam uns com os outros que “a quarter of an hour” eram 25 minutos, possivelmente partindo do pressuposto errado que uma hora teria 100 minutos...Lá os elucidei (não, não me contive: Dicionáááário).De resto tudo bem.

Na manhã seguinte tomámos o pequeno-almoço lá, torradinhas com geleia e chá inglês pois era incluído no preço, e à pala disso quase perdemos o highlight da nossa viagem. Que choques de adrenalina que sofremos quando achávamos que só tínhamos 10 minutos para pagar, arrumar as coisas, e chegar à paragem do autocarro...ufa...o que vale é que um idiota tinha nos dado uma hora errada. Pudemos relaxar os nossos dedos suados e frios, que ainda apertavam a última torrada, pois apesar de toda a pressa, nunca a largáramos. Há que ter prioridades.

O highlight da nossa viagem foi a Wild Wicklow Tour, um passeio de autocarro pelos arredores montanhosos de Dublin, que primeiro nos pareceu caro, pois custa 25€, mas que na realidade nos mostra um pouco daquela Irlanda que temos no imaginário, com montanhas verdes, lagos e nebelinas. Como a Escócia, mas um pouco mais suave. The Emerald Island...

Partímos então, num autocarro com mais 28 pessoas e o condutor, Dave, que era ao mesmo tempo o guia, (isto quanto a: por favor não distraia o condutor...), um bombeiro reformado e interessado em história.

Saímos da cidade por uma estrada ao longo da costa, por onde seguiam também os carris do DART, - um comboiozinho que é muito bom para turistas, pois fornece imensa paisagem costeira, e é económico. Aconselho vivamente, já que a mim ninguém mo aconselhou e não pude usufruir dele. Passámos pelas áreas suburbanas mais finas, onde se situa a embaixada dos EUA, que parece um bolo de noiva, sendo que é isso mesmo que os Irlandeses lhe chamam, e entre outras ruas posh também a mais cara rua de Dublin, Threwsbury Road, onde uma casa foi vendida há pouco pela módica quantia de 52 milhões de euros, e a média por habitação é de 400 mil. É um bom sitio para uma escola como Blackrock School, onde andou o Bob Geldorf e o Primeiro ministro da Irlanda, e que custa qualquer coisa como 15.000€ por ano, se bem me lembro. Queixamo-nos nós das propinas. E a pensar que morrereu aqui um milhão de pessoas à fome há tão pouco tempo, em 1845...

Daí a estrada serpenteava ao longo de costa rochosa até Dun Laohaire (lê-se Dan Leory), onde pudemos apreciar os moderníssimos Catamarans que fazem a travessia entre Wales e a Irlanda em 90 minutos, a uma velocidade de 60 nós, o que, deixem-me mencionar, para os menos náuticamente cultos entre vós, é rápido comó caraças, passe a expressão.

Chegámos a Sandycove, onde fica a famosa Torre de Martello, que tendo sido costruida em 1804, como parte de uma série de fortalezas eregidas pelo exército britânico como protecção contra as invasões napoleónicas, foi imortalizada por James Joyce, que passou lá umas férias conturbadas, uma vez que tinha escrito criticas venenosas sobre uma quantidade de escritores e poetas contemporâneos, entre outros, o seu anfitrião na torre, Oliver St John Gogarty, que lá residia desde 1904. Possivelmente o Sr.Gogarty só concordou em deixar Joyce ficar, com medo daquilo que o jovem rebelde aceso de 22 anos pudesse ainda acrescentar de corrosivo àquilo que já tinha escrito...

Embora curta, e finalizada com tiros de espingarda, a sua estadia, em 1912, neste local inspirante, definitivamente influenciou Joyce, que usou a torre como cenário para partes do seu (hum, ilegível) romance Ulysses, livro que confesso nunca ter lido, embora seja o livro preferido de 3 em cada 4 “intelectuais”, seja lá esse bicho o que fôr, pois eu nunca conheci nenhum. E acho que me escangalhava a rir se alguém se auto-intitulasse “intelectual”, mais ridiculo que isso só filósofo. Bom, eu, sendo tudo menos intelectual, e bem pouco filosófica, lá me arrastei artavés de “The portrait of the artist as a young man”, que por acaso introduz Stephen Dedalus, que os mais corajosos reencontram em Ulysses, a barbear-se na dita torre, que hoje em dia alberga um James Joyce Museum. Poderia dizer vos mais qualquer coisa acerca disto, se fosse intelectual, ou pelo menos um bocadinho mais acordada, mas assim o panfleto que trouxe como background-information lamentávelmente está escrito em dinamarquês, tendo sido tirado da caixa errada, e de pouco me adianta.

Seguimos até Dalkey, uma vila conhecida por ser o local de eleição de ricos e famosos, tendo o seu castelo, Killiney Castle, sido transformado em hotel, e terrívelmente pintado de bordeaux...até se me contorceu o bom gosto. Passámos a casa de Bono, dos U2, e o palacete da ninfa cantadoira Enya, que mais tarde nos ululou aos ouvidos via rádio, numa exposição de nacionalismo sonoro, para depois tomarmos café numa espécie de feira de artesanato permanente chamada Avoca Handweavers. Aí não pude gastar 50 euros em cobertores e xailes de pura lã irlandesa, mas em compensação pude tirar fotos no jardim, que para além de ser muito bonito tem como atracção herbológica ou arbológica um cipreste enorme cujos ramos crescem para baixo, como os de um salgueiro, o que o faz especial, e muito analisado.

Daí é sempre a subir, por uma propriedade enorme – 22.000 acres - que pertenceu outrora a um tal Powerscourt, que tinha tantas pessoas a trabalhar para ele que teve que construir uma vila onde elas pudessem viver, a vila de Enniskerry. A propriedade foi comprada pela famíla Slazenger (raquetes e outra parafernália desportiva!!) que entretanto a doou ao governo da Irlanda, recentemente.

A estrada que subimos chama-se Military Road, pois no topo dela costumava situar-se um quartel inglês que foi transformado num Reconcilliation Centre, ou seja, um lugar onde pessoas conflituosas, mas com vontade de resolver os problemas se podem encontrar para o fazer. Já lá se encontraram por exemplo jovens católicos e protestantes, da Irlanda do Norte, e aparentemente a calma e beleza do sítio leva, geralmente a resultados bastante positivos, pelo menos numa escala individual.

Este paíszinho, que era do mais miserável que há, e cujas principais formas de subsistência sempre foram a agricultura e o turismo, assistindo-se por isso a um verdadeiro “Brain-drain”, isto é, a emigração massiva das pessoas mais educadas e cultas, conseguiu, na última década, ou pouco mais, reverter este processo e assumir-se como a segunda mais forte economia na Europa. Ainda em 1974, uma embaixada de Bruxelas, a mandado da U.E., denominou o país como uma “Third World Western Society”, uma sociedade de terceiro mundo no meio da Europa Ocidental, sendo-lhe por isso atribuidos massivos subsídios e ajudas financeiras, que contribuiram para resolver o problema, e transformar o país naquilo que hoje vemos. No entanto este fenómeno, ao qual se ficou a dever o nome que é dado hoje à Republica da Irlanda: “Celtic Tiger”, tem as suas raízes em grande parte numa astuta acção de redução da “Corporative Tax”, as taxas e impostos que as empresas estrangeiras, que se quisessem fixar no país, tinham que pagar, e que atraiu muitos investidores, tais como por exemplo industrias de ponta como a Siemens, e industrias cinematográficas, para as quais fica muito mais barato fazer as filmagens na Irlanda, do que por exemplo na Escócia. Aliás grandes partes do filme Braveheart foram filamadas num vale ali mesmo, pelo qual passámos. Com isto tudo, entre 1995-8 pode-se verificar que pela primeira vez na história do país a emigração estagnou.

A ideia da Irlanda pobrezinha coitadinha, pode, portanto, ser alterada, pois hoje em dia estamos perante um país que tem dos melhores sistemas de educação (gratuita!) e de saude da Europa, e virtualmente nenhum desemprego. Dito isto, nem por isso tudo são rosas: o custo de vida é muito elevado, o que obriga as pessoas a terem dois e três empregos, a contraírem empréstimos quase vitalícios para comprarem casa, e um subsidio de desemprego nunca é mais extenso do que seis semanas.

Em Glennkrie, onde fica o centro de reconciliação, fica também um pequeno cemitério alemão, que aliás é o único bocadinho de terra irlandesa sobre jurisdição alemã, para além da embaixada, e onde estão sepultados cerca de 100 pilotos alemães cujos aviões foram abatidos sobre este território, na segunda guerra mundial, quando voltavam das missões de bombardeamento das docas de Liverpool, local estratégico na indústria da inimiga Inglaterra.

Uns cinquenta metros mais à frente a paisagem muda completamente: Se nos deslocávamos por terreno montanhoso, cheio de árvores e relva, com pequenos riachos límpidos, agora chegamos ao ponto mais alto das montanhas, e a paisagem de natureza morta, sem árvores, varrida de nevoeiro. O sua principal característica é a turfa, que ainda hoje é cortada, e os pântanos acastanhados com mais de 5000 anos de idade, que cobrem com certeza muitos segredos obscuros. É a atmosfera certa para imaginar seres fantásticos como luzes de fada, que atraem os viajantes mais menos cautelosos, com uma luz quente que parece uma lanterna, só para depois os levar até às partes traiçoeiras do pântano, onde desaparecem para sempre, engolidos pelo nevoeiro, os seus gritos de socorro levados pelo vento uivante...Também pequenos duendes da turfa, castanhos e encarquilhados, com cabelinhos ralos e emaranhados como as raízes da urze...bichinhos do pântano, espinhosos, que se adaptam miméticamente ao tojo e que nadam como peixes pelas poças castanhas...

Passámos o Lough Brie (sim, os irlandeses também chmam isso aos lagos, mas escrevem de maneira distinta dos scots), um lago deixado por um glaciar que comia o seu caminho por esta paisagem há muitos anos atrás, mas que agora desapareceu, e pela nascente do rio Livy, do qual provém toda a água usada na produção da famosa cerveja Guiness - parece impossível, quando se vê a miserável lágrimazinha de água que ele é, ali na nascente. Entrávamos agora noutra grande propriedade, esta de 4000 acres, pertencente à família Guiness., onde dizem que até os riachos não são de água, mas desta cerveja, devido à sua cor acastanhada mas transparente, que provém da turfa, e da espuma branca que se forma quando embatem nos rochedos. Não provei, logo nem posso dizer que seja mentira. Lá que parecia, parecia. Mas se fosse mesmo com certeza estaria lá a SOAEG, sede oficial da associação de estudantes global. E não estava.

Parámos para ver uma paisagem absolutamente linda um pouco mais à frente, mais uma vez uma transformação drástica, pois agora encontravamo-nos num caminho montanhoso com florestas de coníferas do lado esquerdo, e vales paradisíacos do lado direito. Especialmente o vale de Lough Tay é das coisas mais fotogénicas que já me passaram pela frente, não é em vão que é o local mais filamdo da Irlanda....foram ali feitas grandes partes do filme “Excalibur”, e pudemos ver a árvore onde William Wallace, alias, Mel Gibson prendeu o cavalo, e o relvado onde ficava a vilazinha escocesa, no filme. De momento estavam a gravar uma versão cinematográfica de “Curiosity Shop”, do Dickens, e a minha mãe que não estava! Fã incondicional do Sr.Dickens, perdeu a oportunidade de rolar encosta abaixo em reverência, ou quem sabe fazer de figurante...

Roundwood era o próximo ponto de interesse, a vila que fica a maior altitude, em toda a Irlanda, para além de residência do meu estimado Pierce Brosnam, com o qual me tenho dado mais, nos últimos tempos, do que alguma vez imaginei possível...Mas deixem-me garantir que ainda não cheguei ao ponto de lhe cair nos braços gemendo Jaaaaaames, oh, Jaaaames! Vamos lá a ver essas suposições e familiaridades!

A seguir de Roundwood vem Annamoe, uma aldeia minúscula que nem igreja tem, mas em compensação tem Mia Farrow e Daniel Day-Lewis, o qual revi no outro dia no filme “In the name of the Father”, e que surpreendentemente já foi jovem e relativamente bem-parecido. A personagem de “o Talhante” em Gangs of New York é que veio arruinar tudo, ninguém pode partir a cara do Leonardo DiCaprio daquela maneira e conservar simpatias...

Finalmente chegámos a Glendalough, sendo que Glenn=vale + da=dois + lough=lago, logo Vale dos dois lagos onde por volta do ano de 570 viveu um monge eremita, que foi santificado, transformando-se em Saint Kevin. Por acaso eu só há cerca de um ano é que descobri que Kevin é um nome gaélico muito antigo, pensava que era daqueles nomes modernos, à pop star, como Keisha ou Mike...( e refiro-me a “Mike”, a abreviatura, como nome, e não a Michael, mais sei eu que este é bíblico!). Enfim, o dito eremita santificado viveu durante anos numa gruta, e em honra dele foi fundado um mosteiro, ou melhor uma verdadeira cidade monástica, no início do século VII. Nesta cidade, a dada altura viveram mais de 7000 pessoas, e preciso destacar que o sítio é no meio do nada! Visitámos a antiquíssima Saint Peter and Paul’s Cathedral, um cemitério cheio de cruzes gaelicas, uma das quais é a de Saint Peter, sobre a qual há uma lenda no que diz respeito à fecundidade feminina...reza a lenda que se uma mulher abraçar a cruz e conseguir juntar os dedos, irá ter tantos filhos quantos dedos conseguir juntar...e vocês sabem que eu atiro para o comprido...juntei todos os dedos, ou pelo menos os oito que não são polegares, enquanto a maior parte das meninas juntavam dois ou três...ou nenhum! Filipe, vêm aí gaiatos até dizer chega!

No centro do cemitério fica uma Torre com cerca de 300 pés de altura, uns 100 metros, que servia de marco orientador a caminhantes, antes de o senhor Marconi inventar algo que a “supérfluizou”, e também para vigia. Para minha desilusão não tinha nenhuma lenda romântica associada, nem uma Rapunzelzinha pequenina, nada.

Daí (meu Deus, isto é o efeito que a Camila tem sobre o meu português, ela é que diz sempre: E daíííííi fizemos isto...e daííííí eu achei muito caro....e daíííí ele não gostou...) fizemos um passeio deveras idílico entre os dois lagos do vale, um que fica mesmo ao pé do mosteiro, e o outro que fica a uns vinte minutos. Mais senhor-dos-anéis não podia ser, com uma floresta de árvores enormes, e um caminho que ora estava salpicado de manchas de luz e sombra que cáiam pela folhagem, ora estava de “sol líquido”, pois é verdade que na Irlanda se pode apanhar quatro estações do ano num dia, tivemos chuva, sol, vento, nevoeiro...mas a chuva foi piedosa, considerando que se costuma dizer que se der para ver as montanhas é porque vai chover, se não der é porque está a chover...

Almoço tardio, pelas 3 horas, foi num Pub tradicional, mas custava 11€, e afinal de contas ainda tinhamos sanduíches de paté e de atum (em sanduíches separadas, não pensem lá) que procedemos a dividir com uma gatinha preta que apareceu do nada. Sentadinhas ao sol que nem o rei da montanha, e ainda levei o descaramento ao ponto de ir encher a garrafa de água à casa de banho do pub.

Algumas horas mais tarde já estávamos a aterrar em Bristol, tendo usado o tempo de espera no aeroporto para escrever os postais que os mais bonzinhos de vós já receberam e que os mais mauzinhos não mereceram. Aos restantes, as minhas desculpas: Não tenho as vossas moradas, provávelmente. Avó, eu a si mandei-lhe outra coisa, que lhe comprei em Dublin!

Friday, 18 May 2007

Bolhas e futilidades

Dia 17 de Maio

Há uns dias atrás, quando acabei de ginasticar no gym, senti uma dorzinha no dedo do pé, e verifiquei, com grande espanto e desconforto, que o meu dedo do pé já não queria continuar a sua amizade comigo, relação que nutríamos há pelo menos 22 anos...Verdade, o safadinho queria mesmo o divórcio, a separação total, o adeus. Isto numa altura em que, (horrívelmente) já se tinha dado uma separação parcial, que se manifestava através de uma ferida purulenta e ascorosa, que ardia e linfava, se bem que pelo menos não havia sangue. Não me lembrava de ter magoado o pé em lado nenhum, e só o que me vinha à cabeça era a conversa que tinha tido há algum tempo atrás com a Elsa, sobre pé-de-atleta, pois eu sou um bocado descuidada nessas coisas, e nem sempre ponho o chinelinho para tomar banho...Agora tinha sido de vez! Ia ficar sem dedo do pé pequenino, o que apesar de ele ser um pouco deformado, e só ter metade do tamanho do segundo dedo, e alguns pêlos menos estéticos, seria mui triste. Jurei que depois de ele cair usaria sempre chinelos, em concordância com o velho ditado de “em casa assaltada, porta trancada”, ou lá o que é. Comprei imediatamente a pomadinha fungicida, como prenda de reconciliação, e numa tentativa desesperada de o fazer ficar, pois não me imagino viver sem ele. Apesar de ele nem sempre cheirar a rosas, deixar meias sujas por todo o lado, e ser um chantagista, ameaçando doer cada vez que ando o dia todo, ou quero usar sapatos pouco saudáveis. Tipicamente dedo! Um verdadeiro dedo latino.

Afinal acho que tudo não passou de uma tortura psicológica que ele me fez, pois está farto de Inglaterra, e quer voltar para as praias portuguesas, pois afinal curou tal e qual ferida normal...Ainda bem...hoje já voltei a tomar banho sem chinelos...

Ante-ontem fui ao UBU-shop (University of Bristol Union-shop), onde vendem todo aquele merchandising da Universidade, e comprei duas T-Shirts que dizem “Bristol University”, por uns económicos £4.99 cada uma! Agora posso verdadeiramente dizer que “Been there, done that, got the T-Shirt”, achei que nunca me tornaria foleirinha a esse ponto, mas enganei-me. Tal como aos catorze anos achava que nunca iria usar senão calças largas, ténis, e t-shirts pretas. Errare humanum est.

De resto também confesso mais um pecado: Comprei um pacote de ruccola. Isto porque a minha relação com este vegetal tem sido marcada por um desenvolvimento curioso, que começou por eu não saber o que era. Sou do Alentejo, porra. Não se come Ruccola no Alentejo! Temos poeijos, alface, agrião, hortelã da ribeira e sem ser da ribeira, carrasquinhas, catacuzes...mas ruccola?!

Primeira tentativa de aproximação: “Olha, parece espinafres... (sim, pois espinafres conheço eu)...e blerhk, sabe a chulé.”

Reencontro, ou Segunda segunda tentativa de aproximação: “Olha, é o vegetal que sabe a pés...ainda não gosto”

À terceira é de vez: “Se vierem duas folhas a enfeitar o prato, até marcham...”

Finalmente: “Fica tão bem na Pizza!”

Completa perda de princípios: “Vou comprar...que sabor requintado, que trago picante...”

Também tenho continuado a jogar badminton com a Claire, e estamos definitivamente a melhorar, e muito. Olhando para trás não sei como não nos suicidámos de frustração após a primeira hora, mas é a doce ignorância das nossas próprias limitações que nos faz agir assim. Investi foi numa raquete, pois alugar uma cada vez que jogo é muito pouco rentável, visto que custa £1.50 por cada vez, e consegui a raquete nova por £5.99, o que foi uma pechincha, pois inicialmente era £20, embora essa estratégia de marketing também esteja mais que batida, Custava 120---Agora 50!!! E lá vamos nós comprar, pelo simples facto de que não se pode deixar passar a oportunidade de “poupar” 70 dinheiros, por muito que desconfiemos que o preço original era mais para os lados dos 52... Disse agora dinheiros pois era assim que um dos meus maninhos dizia, quando recebíamos a mesada, eu recebia uma moeda de 200 paus (bom velho escudo...), e ele recebia três moedas de 20 paus e ficava todo contente, pois tinha “mais dinheiros” que eu.

Mas voltando ao badminton: o resultado do meu empenho é que fiquei com bolhas na mão, o que não me impediu de continuar a jogar dois dias mais tarde, pois se há coisa que não tolero é gene piegas, de modo a que fiquei com bolhas em cima das bolhas – acreditem, é possível – e amanhã tenho de inventar uma coisa qualquer para evitar bolhas em cima das bolhas das bolhas. Pensando bem, nem preciso inventar, alguém já o fez por mim. O invento chama-se adesivos. É curioso o facto de que nunca tive tão dorida como ando desde que comprei o sports pass...andava eu, muito pouco saudável, mas bem disposta, para agora passar a saudável em sofrimento. A justiça perdeu se pelo caminho, ou melhor, perdeu se de vez numa aula que eu e a Camila fizemos na segunda-feira, que se chama “Swiss Balls”, e passa (não por alguma coisa porca involvendo cidadãos suiços, não pensem) por fazer exercícios usando uma bola de borracha grande. Deve ser muito bom, pois elevou as minhas dores de rabo e pernas para outro patamar! Achava eu que sabia o que era andar dorida...hahaha...A Camila nem se mexia, parecia uma pessoa sobre andas, o que não se justifica, pois ela só deve ter feito metade dos exercícios, pois cada vez que o professor lhe dirigia o olhar, ela quase caía da bola baixo. Isto porque o professor parecia saído directamente da “Malhação”... Se ela estivesse aqui a ler isto estar-me-ia a arregalar os olhos, e a negar tudo, mas eu bem vi.

Hoje fomos jantar ao Nando’s, a Camila, a Gina, a Claire, a Catarina, o Sergi, a Christina, a Elvira, e eu. Estes últimos três são da aula de Advanced English, para a qual fiz hoje uma apresentação de business, sobre Corporate Social Responsability, e como esta afecta os IBO’s que fazem parte de uma companhia internacional como a Amway...Pronto, que é para não dizerem que não trabalho. E acho que tive bastante boa nota.

De resto, à minha alcunha de Boss acrescenta-se que me voltaram a chamar dicionário, coisa que insisto em ler como um elogio, pois é a melhor maneira de lidar com ela. Foi a propósito de a Elvira (que é polaca mas francófona) perguntar ao Sergi(que é de Andorra mas que tirou o curso de francês), em francês, como seria a melhor tradução para “Je vais passer la parola à ma collegue”, ao que o Sergi respondeu “Now my colleague is going to talk”, senti-me impelida a acrescentar algo mais sofisticado, como “I will now hand over the presentation to...” DICIONÁRIO.

Mas voltando ao Nando’s, que se se lembram, é o restaurante wannabe-português onde a Camila trabalha, é relativamente acessível, e a comida era realmente tal e qual a da churraqueira “Avenida”, mais conhecida como (à do)“Venâncio”, em Vila Nova da Baronia...frango assado com batatas fritas. O pastel de nata é que sabia a óleo...meus ricos pastéis de Belém, sinto tantas saudadinhas vossas...

Recebi também duas cartas, uma da Lena, com DOIS postais e uma prendinha (profunda satisfação) e uma do Filipe, com um postal e muito amor (profunda saudade e mimo). É fixe receber correio da pátria.

Dia 18 de Maio

Peço absolução, Senhor, pois pequei. Sim, outra vez.

Comprei uma revista de fraca qualidade, apesar de ter jurado nunca mais o fazer... mas custava só um pound!! E dizia na capa que o Brad Pitt e a Angelina Jolie se tinham separado! Uma pessoa não é de pedra, né?!

Fica o Brad Pitt disponível de volta, e não se toma acção? Seria impensável!

Verdade é que apesar de ele estar velhote, tadinho, depois de andar com a Angelina Jolie, nem o queria dourado e pendurado na árvore de natal, há coisas que são simplesmente devastadoras para o ego, e ser se a mulher após a Angelina Jolie deve ser um delas. Pena que quando eu visse o “Legends of the Fall” pela primeira vez tivesse apenas 13 anos, mas por outro lado, se tivesse sido a Mrs.Pitt teria perdido a chance de vir a ser Mrs.Rosa da Silva, o que seria desgraçoso.

Enfim, comprei, li, senti-me mal, bem, indiferente, e cheguei a uma conclusão sobre as revistas inglesas: ao contrário dos seus contrapontos portugueses, que só destroem a auto-estima, estas destroem e depois voltam a levantar. Porquê? Porque nos apresentam, sim senhora, as absolutamente fabulosas estrelas deste mundo nos tapetes vermelhos dos palácios de Hollywood, corpos torneados, músculos tonificados, cabelos perfeitos, sorrisos encandescentes, MAS, e aí diferem um pouco dos produtos da imprensa nacional, investem pelo menos 50% do seu esforço em arranjar fotos humilhantes destas mesmas estrelas, em situações do dia-a-dia, com close-ups embaraçosos.

É tão bom! Ver a celulite horrorrosa da Jennifer Lopez, a pança flácida da Britney, os joelhos rugosos da Melanie Griffith, a Fergie dos Black Eyed Peas a pular entre as ondas de Malibu com dois pneus lindos e umas mamocas que mantinham um affair distinto com o seu umbigo...E mesmo a senhora Jolie tem peladas na cabeça, onde as extensões se despegaram, está magra que nem um esqueleto, e calça para aí o 43!

HE HE HE.

Isto foi a minha conclusão filosófica do dia.

Mas quem é que tem paciência para pseudo-intelectuais, que só podem gostar de coisas com alta categoria, que nunca vêm um canal de televisão que não seja a odisseia, que se preocupam todo o dia com causas globais...Música independente e alternativa, ou clássica, filmes franceses e polacos, documentários sobre a segunda guerra mundial, o National Geographic, comida japonesa...tudo bem, mas ao fim do dia vejo os Friends, oiço Pop plástico, choro com a novela da SIC e sim, leio revistas mesmo quando não vou ao cabelereiro. E sim também já li Sartre, consigo enumerar os deuses gregos todos, e não acho que o Dalai Lama é um gelado.

Queimei os meus douradinhos enquanto me preocupava com as minhas ervilhas. Não sei se também vos acontece, mas tenho a consciência de que devo comer vegetais todos os dias, e tento fazê-lo, mas fico sempre com a impressão de que os vegetais que estou a comer não são os vegetais certos. Deve ser um caso de típico de “a galinha da vizinha é sempre melhor que a minha”, pois os vegetais dos outros são sempre mais saudáveis. Hoje comi ervilhas e um dressing de iogurte com pepino, folhas de cebola e ervas aromáticas, e acho que cenouras e couves é que teria sido bom.

Ainda outra reflexão menos fútil: como é que há tantas pessoas que escolhem gostar de um animal, e de outro não? Já ouviram falar em racismo? Então os cãezinhos e os coelhinhos e os golfinhos são bonitos, e têm que se proteger, e as galinhas, ovelhas e sapos são feios e não interessa se vivem ou morrem? Que filosofia é essa? Como é que alguém pode dizer que detesta gatos, e isso não ser semelhante a dizer-se que se detesta portugueses? Conhece todos os gatos do mundo, para poder dizer que não gosta de nenhum?

Não percebo.

Várias pessoas que passaram a tarde comigo em Cambridge disseram que nunca teriam tentado salvar aquele pinto, e a Heike nem quis segurar nele durante dois segundos. E não é porque sejam pessoas excepcionalmente racionais, que estão a avaliar os prós e contras e a lei de Darwin, mas é porque não querem saber. Como é possível não quererem saber?

A mim, se me pusessem o homem mais lindo, mais inteligente, mais rico, mais charmoso do mundo à frente, e ele tivesse o azar de enxotar um pássaro à minha frente, estaríamos acabados. Muita coisa é tolerável, mas isso para mim não.

Sunday, 13 May 2007

Constipações e Cambridge

Dia 6 de Maio

Tenho sido portadora de uma saude de aço, felizmente, e orgulhosamente me mantive isenta de todas e quaisquer constipações que faziam dos meus co-moradores fantásmas pálidos e sofredores...Mas agora fui caçada.

Abanhei uma gonsdipasão daguelas gue nhem me bermite balar gomo deve ser, de dão endupida gue esdou....(mas vou vos poupar a parte fonética da desgraça, se me permitem a falta de realismo) Safada, e já com uns vários up-dates, lá me atacou as goelas, e as fussas também, já me tinha esquecido o quanto é bom acordar sem oxigénio, com uma plaina alegremente a aplainar a garganta a cada inspirar, e com o nariz atulhado se ranhoca em diversos estados de solidificação... Ai ai...e eu que tinha que ir a Londres!

Posso dizer com toda a sinceridade que espirrei em todos os lugares importantes de London city...fungando por Camden, rebentando em frente ao Big Ben, chuviscando Saint Paul´s e Westminster Abbey, ribombando séries de espirros sonoros no Millenium Bridge e no Globe Theatre, tremendo as fotos turísticas em frente ao Tower e à Tower Bridge, com a força espirrosa que me balançava...Até mudei de língua, de “Atchim”, para “Hua-Cheng”, enquanto em Chinatown, por questões de adaptação.

Cheguei ao fim do dia com uma dor preocupante num pé, que me impediu de ir ao Gym hoje, que de qualquer modo, como é feriado, talvez estivesse fechado, mas foi muito bom. Acho que para a Catarina, que ia lá pela primeira e última vez durante a sua estadia erasmus, foi bom...London in one day. Comprei mais um côco fresco, e desta ve consegui fazer eu própria um buraco redondo muito profissional nele. Senti-me própriamente rústica, hehe.

O Quin-Li deu me uns remédios chineses, pastilhas para a garganta e uns pacotinhos de pó para dissolver em água, dos quais desconfio muito pois não consigo ler nenhum dos simbolos ou caractéres que explicam o que é. Tomara que não seja lagarto pulverizado. Por causa do lagarto, não porque me meteria nojo, obviamente. Vou agora chupar uma pastilha e já vos elucido.

***

As pastilhas são de cereja, muito boas, nada a dizer, agora os pózinhos...castanho escuros, e a cheitarem a Marmite...não sei se todos conhecem, é uma pasta para barrar no pão ou usar na coinha, e o slogan é “You either love it or you hate it”, parece Nutella, mas nada mais enganoso, pois tem um sabor muito forte a...sei lá, Marmite.

Mas depois de dissolvido em água fica uma espécie de chá adocicado, com um tragozinho a feno.

Entretanto ainda fiz uma cura alternativa com salada de couve, que de acordo com uma teoria da minha mãe não só previne como cura as constipações, e facto é que já estou aí para as curvas.

Dia 12 de Maio

Hoje foi a viagem a Cambridge, que fica no traseiro de judas, é uma viagem de autocarro de quatro horas, e para quem já foi a Oxford nem por isso vale a pena, pois é muito parecido. Isto é caricato, pois as duas cidades nutrem uma rivalidade acesa, sendo que em Cambridge Oxford é só conhecido pelo eufemismo irónico de “o outro lugar”.

É uma cidade bonita, claro, mas vive à sombra da universidade, tudo gira à volta de edifícios, livros, trajes, residências, colleges, turismo académicos, parece que não há mais nada na vida. E os trajes de Cambridge são feios, com uma espécie de carapuço revestido a pele branca, que ainda por cima na maior parte dos casos era natural.

Deviam ir ver uns videos da PETA sobre as fábricas de pele na China, onde os animais vivem numa gaiola tamanho A4 toda a vida, e depois são esfolados vivos por pessoas sorridentes, após serem electrocutados via rectal para ficarem zonzos e não espernearem.

E são precisos umas 30 chinchillas para fazer um casaco.

Gostam dos vossos casaquinhos de pele?

Chegámos a Cambridge por volta das 11:30h, e começámos por um passeio pelo rio Cam, em barquinhos, e a fazer “poling”. Poling vem de “Pole”, uma estaca de metal comprida, com a qual o barco é empurrado, mais ou menos profissionalmente, ao longo do rio, que é bastante raso. Iam grupos de seis em cada barco, com uma pessoa a tratar de faer o barco avançar, um posto não isento de perigo, pois é preciso manter o equilíbrio em ciam de uma plataforma de madeira, que pode bem estar molhada e escorregadia, e o pole tem a tendência de ficar preso no lodo ou entre duas pedras e então se não se larga....ou se cai na aguinha imediatamente com salpicos e espectáculo, ou se fica agarrado ao pole, no meio do rio, tipo macaco agarrado a uma banana...lentamente fazendo um ângulo cada vez mais agudo, até à posição horizontal, que acaba, natural e inevitávelmente também no meio humido. No nosso barquinho foram a Camila e a Rafaela, a Heike, a Hannah, a Catarina e eu, adivinham quem se voluntariou para o posto de poler?

É mais difícil do que se imagina, pois não é só empurrar, a direcção também se quer assistida...e os caloiros do poling não fazem senão tristes zigue-zagues, entrecortados de voltas de 180º, airosas mas desnecessarias. Era bastante engraçado ouvir o pessoal que ia sentado guinchar de medo a cada solavanco inesperado...e eu? Ali de pé? Eu é que devia guinchar. Ou então a darem conselhos inúteis...O único que me ajudou foi um da Catarina, que me aconselhou “Steer left if you want to go right”..se algum dia tentarem, lembrem-se. No entanto quando ela tentou nem, por isso se saiu melhor.

A Camila ia sentada com um ar de lady do século XVIII, suspirando “Beauuuutiful...beauuuutiful....isn’t it loooooovely?”, enquanto eu ficava cada vez mais transpirada. Quando troquei com a Catarina lá percebi o que ela queria dizer, pois realmente o rio serpenteava entre relvados e salgueiros pendentes, por entre os colleges ancestrais, de uma forma muito pictoresca. Uma chuvada muito súbita e torrencial acabou por borrar um bocado a pintura do tal quadro pictoresco, mas que me estragou mesmo o dia foi encontrarmos um pintaínho de galinhola, a boiar quase afogado, sem mãe por perto, que obviamente tive de pescar e secar, mas que depois de me causar imensas preocupações, e recuperar bastante bem, acabou por morrer, pois recusava-se a comer, e como era fim-de-semana, não o consegui levar para a instituição adequada suficientemente depressa...Era tão pequenino e felpudo e feio...coitadinho.

Antes de começarmos o nosso passeio de barco eu ainda tinha dito que se houvesse alguém, entre as 40 pessoas que iam, que caísse à àgua, haveria de ser eu. Devia antes ter dito que se houvesse alguém entre as 40 pessoas que acabaria o dia com um pinto moribundo debaixo da camisola, que seria eu.

Olha, querem o quê?

A seguir tivemos uma hora livre para o almoço, e depois fizemos uma visita guiada, que no entanto foi tão semelhante à de Oxford que até tenho preguiça de descreve-la.O ponto alto foi quando a senhora que conduzia a visita teve um ataque de irritação na garganta, daqueles que é só umas picadas secas que trazem as lágrimas aos olhos, e que por mais que tussamos não há maneira de irem embora. Claro que isto não é engraçado em si, engraçado foi o facto de ela tentar determinadamente continuar a falar, e saía-lhe uma vozinha de rato tão terrivelmente hiariante que tive de me afastar uns passos, pois ia parecer mais que má educação estar me ali a descascar a rir da desgraça alheia.

De resto, mais alguma informação trivial: O edifício mais antigo de Cambridge é o St.Benedicts Tower, que é do tempo dos Saxões, antes da batalha de Hastings, e tem cerca de 1000 anos de idade, mantendo-se firme e sólido.

O mais antigo dos colleges de Cambridge é o Peterhouse, que foi fundado em 1284, por um tal Hugo Belchamp.

Trinity college, o maior college da cidade, fundado por Henrique VIII em 1546 produziu sujeitos tão ilustres quanto Isaac Newton, em honra do qual cresce uma macieira, importada da sua cidade natal, em frente à entrada principal; W.M.Thackeray; Lord Tennyson, e também Sacha Baron Cohen, mais conhecido como Borat ou Ali G...

São 80 os vencedores de prémios Nobel provenientes de Camebridge. Quantos terá Évora? ;))

Dia 13 de Maio

Hoje fui com a Claire a Cribbs Causeway, um centro comercial grande, a cerca 45 minutos de autocarro daqui de Hodgkin House. Precisavamos achar uns sapatos elegantes, para combinar com o tailleur dela, e uma camisa branca, pois ela tem uma entrevista importante amanhã, que decidirá se ela vai para o Japão já com trabalho, ou se vai como desempregada à procura de ocupação...espero que tenha sorte. Acho que pelo menos as referências e competências necessárias tem.

Os sapatos foram uma dor de cabeça, pois a menina embora pareça uma fada, tem joanetes terríveis, e nada serve. Para além do mais ela precisava de sapatos de salto, mas um salto comfortável, e só queria era sapatões com uma altura quase pornográfica, com os quais não conseguiria dar um passo sem se desequilibrar e cair para cima do seu potencial chefe, coisa que de certeza lhe valeria o emprego, mas que no entanto seria de miserável profissionalismo. Lá conseguimos um compromisso mais ou menos calçável, e uma camisa também, o cabelo é que não sabemos muito bem. Vamos daqui nada experimentar uns penteados, e se eu fôr bem sucedida isso implica a minha presença e dons de cabelereira pelas 5 da manhã de amanhã, tomara que a essa hora eu já consiga fazer algo de jeito. Ninguém vai empregar uma pessoa que parece que usa um Sunday em cima do cocoruto.

Tuesday, 1 May 2007

Góticos e Gyms...

Dia 1 de Maio

Dia lindo, lindo, com sol, calor, céu azul e todos os liláses em flor...a relva coberta de ingleses descascados, e afloresce-me à alma uma reflexão sobre o estilo gótico.

Isto porque não tenho nada melhor que fazer, pelos vistos.

Bom, o estilo gótico, esta coisa relativamente nova da nossa sociedade, mas bastante prolifica, especialmente por aqui, onde até há uma revista chamada “Gothic Beauty”...É multifacetado, como quase tudo, mas eu vou me debruçar sobre a sua manifestação mais óbvia, que são os góticos à primeira vista, ex-loirinhos desnaturados, de cabelo mal pintado de preto, vestidos de preto e cabedal, piercings, correntes, tatuagens a dizerem night e darkness...Isto porque neste como em qualquer estilo há os hardcore e os softcore, não sei bem quais são os hardcore-goths, mas a maior parte dos que vejo são fashion-goths, que ouvem Nightwish, Evanescense, HIM...teens mergulhados nas profundezas da agonia que é ter 15, 16 anos, e as hormonas aos pulos.

E o estilo é apelativo, confesso...é simples e obscuramente romantico mas profundamente desadaptado à realidade...Isto porque ninguém consegue ser gótico o tempo todo...O mundo felizmente não é um lugar de um filme a preto e branco, onde donzelas alvas em vestidos medievais mergulham em bandos de morcegos aveludados, boiam em charcos de águas negramente translúcida, entre flocos de neve cor de sangue...Não dá para ser sempre solene e melancólico, de cabelos negros chicoteados pelo vento de passagem, em companhia de um lobo e de um anjo negro de caracóis escuros e maçãs do rosto ossudas, de sorriso triste. Não funciona! Faz sol, tem se calor, quer-se um gelado cor-de-rosa. Os amigos contam uma piada, o rosto enrubesce e rimo-nos, temos uma avozinha, vamos à casa de banho, às piscinas, à praia...ou senão somos uns tristes, fechados como Romeu no seu quarto, criando uma noite artificial. E foi isso que vi hoje: góticozinhos vermelhos e suados, a arrastarem os casacos compridos de cabedal preto rua acima, as nucas tatuadas expostas ao sol, e perdendo toda a alvura doentia, o que os faz simplesmente parecer ridículos...peixinhos fora de água...

Proponho que se crie uma espécie de terrário para os pobrezinhos, uma área suburbana, com um quintal com floresta pegado, uma constante chuvinha grisalha, bem temática, e uns huskies abandonados para fazerem de lobos. Não apoiam?

Tema dois: O gym.

Análise do dia: três tipos diferentes de hordis feminis, os exemplares femininos que frequentam o local:

1) Não sou modelo, nem quero saber, hei-de estar em forma, e não quero saber se a minha T-Shirt era do meu pai quando este era obeso e derramava sopa sobre ele próprio, se as calças deixam ver 15cm de perna peluda, se o meu rabo de cavalo se desmancha em mechas suadas e oleosas e parece que fiz chi-chi nas calças...tou no gym, sim? Quem não gosta, que não olhe.

2) Fogo, esta barriga...mas agora que estou no gym, há de desaparecer...o top condiz com as calças, sim, e investi em dois ganchos para a franja...afinal não quero meter medo a ninguém enquanto me estafo...

3) Aiiiii...sem maquilhagem fico horrível...Mas em compensação consegui comprar uns calções iguais aos da paris Hilton no e-bay, e também tenho o cabelo como o dela. Um-dois-um-dois...aiiiiii tou rebentada...será que aquele moreninho está a olhar para o meu rabo?

Agora com o calor que está é preocupante quantos números 3 andam por lá...prefiro os números 1...

Eu obviamente pertenço à saudável meia medida, hehe.

De resto, vou escrever um essay sobre “The ongoing popularity of James Bond”, uma questão que me intriga há algum tempo...dar-vos-ei a conhecer hipotéticas conclusões geniais.

Monday, 23 April 2007

Cornwall..dias de sol e mar!

Terça-feira, dia 17, lá parti para mais uma viagemzinha aqui pela ilhota, desta vez para Cornwall. A Heike tinha planeado tudinho, foi só pagar e ir...Quatro horas de comboio, pela paisagem verdejante inglesa, que pouco a pouco se ia alterando para um cenário mais costeiro, com menos árvores, e mais rochas e mar azul...depois de mudarmos de comboio em Exeter, e tentarmos dormir mais um pouco, experimentando novas e alternativas posições, como por exemplo debruçadas para a frente, com a cabeça em cima do saco das sandes, ou de pescoço em U e o maxilar a descair pouco esteticamente. E eu que tenho um pescoço comprido...dá para curvar bem, mas depois tem mais centímetros doridos que o de outras pessoas. Não cheguei a mostrar o meu bilhete, pois quando o pica passou eu estava ocupada com o irmãozinho da morte (chôno) e apesar das tentativas débeis da heike, não me incomodei. Ela tentou acordar-me abanando-me um pouco, tadinha, mal sabe ela da qualidade do meu sono, da qual me orgulho...acho que até me poderia ter lambido a orelha que eu não acordava, pois estou habituada a dormir pouco higienicamente com cão. Nariz frio na cova do pescoço é que é remédio santo, mandá-la-ia logo para o sofá. Bem, lá chegámos a Penzance, a nossa base de exploração de Cornwall – pois recuso-me a dizer Cornualha, coisa horrível – onde saímos mesmo em frente ao gabinete de turismo, podendo nos então abastecer de todo o tipo de panfletos, folhetos e prospectos, que passamos a carregar para o nosso Backpackers Hostel, o “Blue Dolphin”, que fica a uns 12 minutos da estação e é muito recomendável. É uma casa residencial, que foi alterada para pousada, com cozinha, quartos limpos e ambiente familir. Dormimos num quarto só para meninas, mais uma senhora australiana, a Pauline.

Libertadas do peso e da responsabilidade que as malas acarretavam, decidimos explorar o Saint Michael’s Mount, na baía de Marazion. Este Mount é uma semi-ilha (eu sei que existe a palavra peninsula, vivo numa, mas não serve para aqui), pois quando a maré está alta é preciso apanhar um barquinho, por 3£ ida+volta, enquanto quando a maré está baixa, se chega lá a pé. Obviamente nós tivemos que apanhar a maré alta para lá e para cá, pois estamos a tentar poupar dinheiro, e o universo não pode facilitar, desembolsámos os 3£, a uns 50metros da terra firme (embora a Heike murmurasse qualquer coisa sobre nunca se dever pagar ao barqueiro ntes de se chegar ao outro lado do rio), e tivemos a alegria de uma simpática viagemzinha de barco, até ao cais do Saint Michael’s Mount, que se erguia à nossa frente, comportado semelhanças notórias com a “Ilha Negra”, um dos livros de Hergé. Para os menos cultos no universo da BD de qualidade, o papá do Timtim.

No início do caminho, que serpenteava monte acima até ao castelo, colocado aristocráticamente sobre o topo da montanha, encontrava-se um servente do universo, encarregado de nos despojar de mais uma quantia de massa, cortando ainda mais fundo nos nossos módicos recursos. Pagámos, calámos e subimos. Escadas de pedra antiga e moldada por séculos de pés cansados em ascensão, e pés ligeiros em “descensão”, rodeadas de plantas pouco inglesas, como camélias, agaves e árvores-de-dragão, explorando então o castelo, que, como viemos a descobrir inicialmente era um mosteiro, construido no local após uma visão milagrosa de Saint Michael, flutuando etéreamente sobre os topos das árvores, com um cartão preso na lapela, que o identificava como tal, suponho. Com a secularização das propriedades eclesiásticas debaixo de Henrique VIII o mosteiro foi transformado em Castelo/fortaleza, e mais tarde em casa senhorial. Visitámos tudo, algumas coisas ainda testemunhavam de um passado monástico, outras eram mais recentes, a vista, linda e eterna, era absolutamente invejável, e aparentemente ainda vive lá uma família, chamada St.Aubyn. Hasteada no exterior do edifício, e chicoteada pelo vento fresco que se fazia sentir, agitava-se a bandeira da Escócia, curiosamente. Azul escura, com a cruz branca, pareceu-nos a nós. Perguntámos, ao que a senhora da bilheteira nos ia deglutindo com uns olhos muito esbugalhados e escandalizados, pois tratava-se da bandeira de Cornwall, que é preta. Palavra de honra que contra o céu azul parecia azul escura...Regionalistas do caraças, levam tudo a peito.

De volta a terra firme verificámos que a rocha a partir da qual tinhamos apanhado o barquinho agora se encontrava completamente submersa, e como os nossos estômagos não têm muita estamina turistica, e requerem comida pelo menos duas vezes ao dia, procurámos a estação dos autocarros. Tinham nos dito que era em frente do hotel, as não se via sinalização nenhuma...as nossas dúvidas dispersaram-se quando o autocarro para Penzance dobrou a esquina ao fundo da rua, e voltaram a entrar em força quando apesar de pularmos e agitarmos os braços passou por nós sem parar, com um Vroooouuuum que parecia pingar chacota. Olhámos uma para a outra perplexas, discutindo a vantagem de usar mini-saias para fazer parar autocarros, quando uma senhora nos elucidou de que estavamos a 5m da paragem DESENHADA NO CHÃO, e que nunca parariam se não estivéssemos em cima dela, nem que fossemos a Angelina Jolie em top less. (Não utilizou exactamente estas palavras, a senhora, obviamente). Dirigimo-nos ao sítio certo, no centro das quatro linhas amarelas, e aí ficámos a apanhar brisa marinha e sombra durante 50 minutos. E não dá para imaginar o frio que faz assim que o sol desaparece atrás de qualquer coisa! A Heike aproveitou para ter um acesso de sentimentos primaveris, e abriu a bolsa da frente da mala, deixando que a anteriormente mencionada brisa semeasse todos os papelinhos importantes e menos importantes pelas quatro direcções da rosa dos ventos, mas especialmente para o lado do mar, onde, com somzinhos alegres de enxovalho, se precipitaram falésia abaixo, desaparecendo. Tudo isto debaixo do nosso olhar perplexo, pois somos senhoras, e como tal somos lentas e ponderadas. Se estivesse lá o Filipe ter-se ia subdividido em seis, apanhando todos os items antes que eles tivessem tempo de dizer chh-chhh. Mas não estava. Nem quero saber as coisas que lá iam e que ela ainda não deu como perdidas...!

Fi-nal-men-te lá apareceu um mini-autocarro, que - halelúia – parou. Enfiámos os nossos bilhetes (que felizmente se encontravam entre a papelada que sobrevivera a crise da Heike) na cara do rapaz que conduzia o abençoado veículo, quando, já de pézinho alçado, e mentalmente preparadas para irmos de cuzinhos tremidos até Penzance, o rapaz nos diz: Eh, desculpem, mas estes bilhetes só dão para os autocarros da First!

Escapou-me um “Shit” sentido, - se bem que pouco bem educado e ainda menos usual, pois como sabem não costumo pragejar, pelo menos na oralidade, na escrita por vezes sai me uma ou outra coisa menos vitoriana – que acabou por ser o nosso bilhete, pois o condutor descascou-se a rir, e levou-nos mesmo sem bilhetes válidos. Ainda gozou comigo várias vezes, dizendo que era a primeira vez que via umas turistas tão desbocadas, e que estava acostumado a ser saudado com “Hello”, e não com palavras obscenas, mas o momento de “Ups” foi quando nos perguntou o quais eram os nossos planos para a noite...Ainda tive um segundo de receio que nos fosse convidar para sair, mas contentou-se com a resposta evasiva de que estavamos cansadas e iamos ficar em casa. Foi este o nosso encontro com o John de Liverpool.

Terminámos o dia a passear por Penzance, pelo caminho junto ao mar e ainda comprámos comida: um pacote de esparguete por 18 pence, e um frasco de molho por 69 pence, os quais nos renderam dois jantares...que ninguém diga que não somos poupadinhas.

No dia seguinte comprámos o day ticket por cinco pounds e com ele viajámos até Porthcurno, onde queriamos visitar o Minack, consoante o folheto turistico “Cornwall’s theatre under the stars”. Se parecia uma coisa de pouca importância enquanto faziamos a caminhada até lá, encosta acima, com um solzinho daqueles que se não fosse em cornwall teria características exclusivamente tugas, quando lá chegámos mudei de ideias. Começava-se por uma exposição muito bem conseguida, que para além de fornecer todo o pano de fundo, nos deixou cheias de vontade de ver o dito teatro. Contava a história de Rowena Cade, uma senhora absolutamente incrível, que de uma adolescência serena e protegida, numa casa vitoriana em Cheltenham cresceu para ser uma apaixonada por teatro, representando peças de Shakespeare no jardim da sua nova casa na falésia de Porthcurno. Era ela que tratava da organização toda, desde costur fatos de duendes e asas de fada para “Sonho de uma noite de verão”, até engendrar a melhor maneira de posicionar os actores em cima de folhas de nenúfares falsas que insistiam em cair...Quando decidiram representar “A tempestade”, em 1932, o jardim deixou de servir como palco, e Rowena chegou à conclusão de que nada seria melhor como cenário do que a própria rocha da falésia, começando então a construir o Minnack Theatre, como ainda o podemos ver hoje, um amplo anfiteatro maravilhosamente situado nos píncaros escarpados, por cima do mar, lembrando as montanhas de chipre na antiguidade clássica, e com um toque absolutamente mágico.

O que começou por ser um projecto estranho acabou por se o sonho de uma vida, pois Rowena Cade trabalhou na construção do teatro até quase aos noventa anos, quando faleceu, e pode se dizer que quase o talhou a dente, com a ajuda de um ou dois amigos, acartou sacas de cimento e vigas enormes pelas encostas acima incansávelmente. Há uma história na exposição que testemunha da impressionante força de vontade dela, quando ela já idosa, e uma idosa com um ar muito frágil, - tinha uns bracinhos cheios de veias e tendões que pareciam da grossura de silvas – levou, sozinha, e ao longo de uma penosa manhã, quinze barrotes enormes, que tinham aparecido na praia depois de um acidente com um barco de carga, rocha acima até ao teatro, onde precisava deles. Quando mais tarde a polícia a interrogou acerca dos barrotes ela respondeu: “Sim, sim, levei alguma madeira até ao topo da falésia...Quer vir ver se é a que procura?” Obviamente os policias nunca pensaram que uma decrépita velhinha pudesse ter levado tais pesos até lá acima, e nem se preocuparam em ir verificar...

Só foi muuuuuuuuuita pena não podermos ver uma peça, pois o teatro funciona, e agora até está totalmente equipado com sistema de som...mas só a partir de Maio é que começam as representações.

Daí seguimos para um outro ponto alto da nossa viagem, uma caminhada desde o teatro até Land’s End, três horas ao longo da costa, por um trilho que parecia feito por ovelhas, e as mais lindas paisagens e vistas que se possam imaginar. Demorámos mais do que as três horas previstas pois a cada passo tínhamos que nos desfazer em ooooh’s e aaah’s, avançando à maneira japonesa, de foto em foto. Falésias, gaivotas, relva mais fofa que tapete persa, um mar que não podia ser mais azul e um sol que nos tostou as ventas em menos de nada...a mim porque estava com a mania que portugueses não apanham escaldões em Inglaterra, e a Heike porque é ruivinha e a pele dela é aparentada com a do Casper (Gasparzinho o fantasma) e nem o creme solar lhe serviu. Devia me ter lembrado que sou meia alemã, pois deve ter sido essa a parte que queimou, mas felizmente dois dias depois tinha passado a um bronzeado saudável. Parámos várias vezes para comer maçãs, sandes, bolachas de chocolate, encher as garrafas de água numa fonte chamada “Holy well” (okay, só eu é que enchi, pois sou psicótica) (não não apanhei febre tifóide nem salmonelas) (sim, eu sei que não de deve beber de fontes das quais não se sabe a qualidade da água), apanhar um fura-pastos (pequena cobra tipo lagartixa sem patas) (okay, fui só eu que tomei esta iniciativa, mais uma vez), alimentar dois póneizinhos gordos com maçãs (ahum...eu outra vez), e despir mais roupa, até já praticamente nuas, chegarmos a Land’s End, a ponta mais ocidental da Inglaterra.

Aí passamos da Natureza selvagem e gratuita para algo mais turístico, com a “Primeira e última casa de refrescos da Inglaterra”, fotógrafos oficiais e lojinhas de lembranças. Não gastamos um “tusto” e seguimos com o nosso prático bilhete de autocarro para Newlyn e daí para Mousehole, que não se lê “Mouse Hole” mas sim “Mou Zoule”, parece que os nativos não gostam que soe como se morassem em “Toca de rato”, preferem “Tocade-ra Tô”. Mousehole é uma pitoresca vilazinha de pescadores, qualquer coisa como Cascais há 40 anos atrás, talvez, mas às sete horas da tarde parecia uma vila fantasma, não vimos uma pessoa que fosse. Piores que as galinhas, estes ingleses.

Gememos montanha acima, sobre umas pernas que ameaçavam entrar em greve, mas a Heike parecia um general, e eu que também tenho o meu quê de militante (a minha alcunha é, como já referi, “Boss”) também não queria ficar atrás, e raios nos partissem ou não víssemos todas as vistas bonitas que os nossos olhos e cérebros pudessem armazenar. No topo da montanha não se via muito bem, por causa de casas e vegetação irritantemente colocadas, mas em compensação a minha costela de botânica ficou muito feliz ao encontrar vários ruibarbos gigantes. Ruibarbo (Rhubarb) é uma planta não muito conhecida em Portugal, assemelha-se a couve portuguesa, mas tem uns talos muito grossos, que se não apanharam sol a mais se mantém cor de rosa e que então podem ser estufados e preparados como doce. São muito ácidos, e usam-se em bolos, compotas, etc, de preferência com molhos de baunilha, Custard, custarda, como lhe quiserem chamar. Os Ruibarbos gigantes nada tem a ver com esta planta comestível, a não ser a aparência, mas são absolutamente enormes. Tiarámos uma foto comigo debaixo de uma folha que era maior que um guarda-chuva grande, com um talo da grossura do meu braço, pareço um cornish pixie...

No porto, onde eu não tirei muitas fotos, pois parecia mesmo Portugal, ainda nos deparámos com pequenos bárbaros da Cornualha, uma raça muito distinta, os quais envergavam fatos de borracha, e com gritos inarticulados se atiravam dos paredões abaixo para as águas gélidas mas límpidas do atlântico. O mais pequeno devia ter dois anos e meio, mas estava só trajado a rigor, ainda não pulava. Deve ser o ritual de iniciação.

Muito inteligentemente desta vez encontrámos a paragem desenhada no chão, embora nos sentíssemos como bonecos de monopólio, à espera no quadradinho que diz “Paragem”, e nem nos pagaram os 20.000 de termos passado a partida, e voltámos para Penzance, para um dormitório com mais duas raparigas. E uma delas ressonava mais que o Winston, e não tinha depósito. (Depósito é uma parte da anatomia de um cão, é o espaço solto do beicinho, que propicia um ressonar especialmente vibrante).

O último dia da nossa viagemzinha foi passado em Saint Ives, outra vila muito mediterrânica da qual poucas fotos tirei, com mais horas de sol impiedoso nas extremidades avermelhadas e pouco fotogénicas. Saint Ives está recheadinho de artistas e galerias, entre outras um Tate Modern Saint Ives, que odiei...ainda pensei que Francis Bacon fosse alguma coisa de jeito, pois o nome não me era estranho, mas era pavoroso...acho que eu tinha um homónimo qualquer na cabeça. Que coisas mais feias e sem jeito. Meu rico dinheiro. Caixas com bolas de ping-pong e uma ventoínha que fazia as bolas mexer...Profuuuuuuuuundo! Uma filmagem de uma onda cheia de garrafas de plástico que quebrava repetidamente contra uma rocha. O que quererá dizeeeeeer?

Comemos as famosas Cornish Pasties, um tipo de folhado em forma de rissol gigante, que eram muito boas, - uiui, agora marchava uma, - fizemos festinhas a staffordshire terriers na praia, experimentámos o famoso gelado de Cornwall...As gaivotas é que são umas pestes, arrancam literalmente os gelados das mãos das pessoas, em voo picado, na gelataria até estava um papel a avisar de que não substituíam gratuitamente gelados roubados por gaivotas (nem quis acreditar que alguém teria a cara de pau de pedir isso), e eu que levava o gelado numa mão, e um caranguejo perneta na outra era um alvo duplamente atraente. O caranguejo estava lesionado e longe de água, não era para eu comer, era só para levar até ao mar. Qualquer pessoa com uma fobia incurada de aves viverá em Saint Ives o seu pior pesadelo, pois os bichinhos fixam um olho amarelo e malicioso em nós, que até a mim me arrepiou, mas nunca me rendi. Aliás, enquanto esperávamos pelo comboio até lhes dei umas bolachas, que elas vinham buscar à mão, de modo a habituá-las pior ainda para os próximos turistas. Depois de mim o dilúvio.

Por volta das três e meia voltámos para Penzance, comprámos uma comidinha para o caminho, e fomos buscar as malas à pousada, para apanhar o comboio às 17:30 para Bristol, onde chegaríamos por volta das 10:00.

Não fosse...não fosse...

Não fosse eu ser loira e a Heike ruiva. Não fosse termos comprado fruta, que ainda precisámos lavar. Não fosse ainda termos ido às casa de banho, e termos escolhido ir até à estação por um caminho que não conhecíamos, e que se alongava em intermináveis curvas nunca mais chegando ao nosso destino.

Mas porque é que não corremos no início? Começámos só a correr quando era já uma causa perdida, as mochilas pesadas a tolherem os nossos velozes e fluidos movimentos, as malas a baterem-nos contra as formosas e longas pernas, os cabelos a flutuarem, os olhos revirados numa agonia desesperada de veado moribundo...era pois tarde...o sangue subia-nos aos rostos, dando àquelas feições marmóreas uma cor de vida falsa, um rubor do qual transparecia o cansaço, força para a luta que nos abandonava, quando vimos o comboio a pôr-se em movimento, com as demoníacas luzes vermelhas da retaguarda num esgar malicioso de quem sabe que a vitória é certa...Vida, morte, veloz, luzes ao fundo do túnel...

Acenámos em vão ao todo-poderoso deus do apito....o comboio partiu sem nós.

*Pausa para limpar lágrimas de emoção*

Voltando à realidade menos homeresca e épica, lá estávamos nós, com dois minutos de atraso a arruinarem umas fériazinhas perfeitas...parecia que era só para embirrar!

Não havia mais comboios para bristol, nem no dia a seguir.

Sentámo-nos em cima dos nossos casacos, ao sol do entardecer que, como sabiamos se iria brevemente transformar num crepúsculo cinzento e frio, passando a uma noite escura que estenderia os seus finos dedos gélidos para envolver as carnes frágeis e cansadas dos nossos corpos, talvez pela última vez...Talvez os nossos olhos contemplassem ainda as cores vivas e gloriosas da aurora, antes de fazermos do cimento cinzento a nossa última almofada, dos fieis anoraques vermelhos a nossa mortalha, e das luzes de néon da estação a nossa vela...Peço desculpa, o estilo épico tem o seu charme, não me consegui libertar de uma vez.

Havia um autocarro possível, recheado de grandes talvezes, que iria na direcção de Bristol, mas não até lá, mas era só às 20:00h, o que deixou tempo para a Heike ir dar um passeio, a ver se lhe passava a frustração, do qual demorou imenso a voltar. Eu entretanto tinha conseguido descobrir que haveria um autocarro para o aeroporto de Bristol, lá para as 21:00h, e ela não havia maneira de voltar a aparecer, suspeitei mesmo que se teria atirado ao mar, em desespero, mas quando finalmente chegou, afirmou que nem isso teria sido viável, devido à presença de mais bárbaros cornwalleses, estes maiorzitos, que com certeza não teriam hesitado em pescar uma donzela suicida. Já não se pode fazer nada!

Enfim, chgámos a Bristol pelas 3 da manhã, com dores nas costas e dores na carteira...digo vos, se calhar vale mais a pena perder um avião do que perder um comboio em Inglaterra. E agora deixemos os nevoeiros do esquecimento cobrir o infame erro.

E nunca mais ameaço escrever textos cómicos sobre pobres criaturas que perdem o avião...

Friday, 20 April 2007

It´s a Funderworld

No Domingo, dia 15 de Abril, fui com a Gina, a Claire, o Sila e o Imran ao Funderworld Themepark, uma espécie de feira popular móvel. Não pudémos ir quando estavam cá o Fil e os meus irmãos, mas para uma pessoa não ficava tão caro. Foi divertidíssimo, por 10 pounds podíamos ficar lá 4 horas e andar em tudo o que quisessemos quantas vezes os nossos estômagos aguentassem. Optámos por ir entre as 6 eas 10, pois é quando começa a escurecer, e há todo aquele ambiente de feira, com luzes, néons, cheiro a relva pisada, algodão doce e pipocas, música terrível, que só se gosta enquanto se anda de carrinhos de choque, tudo envolvido num entardecer suave de primavera.

Começámos cuidadosamente com o Wild River Trip, enfiados num Donut gigante, escorrega de água abaixo, aos guinchos, do qual emergimos de cús molhados, para passarmos para a montanha russa, onde deixámos os guinchos e passámos a gritar como mulheres sérias, tendo sido tirada uma foto desgraçante na pior parte, que tivemos que comprar, pois está hilariante: parecemos três vampiros tresloucados a perseguir uma mousse de chocolate...

Seguiram-se os aviõezinhos sobe-desce, depois para um ridículo comboio fantasma (o nosso casão, que tem um morcego verdadeiro, é mais assustador), os carrinhos de choque, e então para um daqueles carrocéis com banquinhos presos a correntes, onde as coisas começaram a correr mal para a Gina, que se debruçou graciosamente, e sem salpicos nem sons horrorosos se vomitou toda, desde a gola até ao umbigo, incluindo a mala que tinha ao colo... Tadinha, ficou tão embaraçada, mas agora somos não irmãs de sangue, mas irmãs de vómito, pois eu limpei a mala dela, e era daquelas cheias de costuras e bolsinhas...Não sei se tive todo o mérito que merecia por esta acção.

Obviamente ela não foi nos engenhos seguintes, um que era um banco preso a uma manivela, que nos girou até ficarmos com as entranhas coladas às amigdalas, mas felizes, nem ao “Jack the Ripper’s Revenge”, que era uma centrifugadora humana, muito simplesmente, que não deve fazer nada bem à mioleira, que fica ligeiramente torta, colada ao lado esquero do crânio, num montinho cinzento...mas também, não há muito que se perca.

Entretanto a fada vomitadora já sentia mais bem disposta, e quando voltámos à carga nos aviõezinhos, ela já foi. Estes aviõezinhos têm a particularidade de caberem três pessoas e as duas do lado exterior, especialmente a que está colada ao lado da parede do assento, são trespassadas pelos ossos das ancas da gorda do lado de dentro, para além de serem expremidas que nem tremoços. Eu juro que cheguei a pensar que saltava com um som viscoso, deixando somente uma pele seca e uns longos cabelos para a posterioridade, enquanto a minha alma imortal zunia em direcção ao céu azul, passando a imagem mal pintada de uma loira voluptuosa que, a julgar pela tatuagem, devia ser a Pamela Anderson. Esse deve ser um dos aspectos menos bons da fama, aparecer-se pintada a spray em todo o tipo de maquinas das feiras, vesga e mal desenhada por um chunga qualquer com aspirações artisticas... Embora haja algumas figuras bem desenhadas, verdade seja dita.

Saí do meu lugar a tempo de ver a Gina debruçar-se discretamente, vomitando o resto dos conteudos do seu delicado corpinho, não sei como é que há tanta gosma dentro de uma pessoa tão pequena, deve ter ficado absolutamente oca, depois da segunda dose.

A feira acabou ali para ela, mas a nós, os rijos, os valentes, os impossíveis de enjoar, estavamos lá para as duas piores máquinas da feira, o Super Twister, que se assemelha a uma rodinha dos ventos, com a particularidade de ter pessoazinhas presas em bancos nas pontas que não só giram à volta do eixo grande, como também sobre si mesmos, ficando de cabeça para baixo, em curva descendente, a uns (sentidos) 300kms à hora. Fantástico. Parecia que iamos morrer. Os divertimentos dos seres humanos, hein?

Fizemos pausa com o carrossel dos cavalinhos, no qual eu fiquei com o único galo, o que deu origem a piadas linguísticas em inglês, com a palavra galo, que não irei repetir aqui. Mas este foi só por brincadeira, pois continuamos a ser durões, malta da pesada, e estavamos somente a lamber as nossas feridas antes de atacarmos o Big Ben, uma torre altíssima, rodeada por um quadrado de bancos, onde as vítimas, num momento de falta de lucidez, se sentam, para então serem disparados para a estratosfera. Ao contrário do que dizemos em português, para cima posso eu bem, todos os santos ajudam aquilo a subir, mas para baixo é um horror! Ficamos suspensos a uma altura contra-natural, que nos faz encolher tudo o que temos dentro da barriga, até que fique do tamanho de uma noz muito pesada, que então, quando somos projectados em queda livre para um fim seguro, espatifados no chão de ferro a milhares de quilómetros de distância, por baixo de nós, nos salta para a garganta e faz a voz ficar como a de um hamster que respirou hélio. Aliás, tenho a certeza que enquanto eu descia acompanhada de um silvo agudo, qualquer coisa importante da minha anatomia ficara alegremente a flutuar 100 metros acima de mim, a apreciar o ar fresco, a liberdade, e a linda vista de Bristol. Tenho saudades dessa parte. Chamava-se juizo.

À volta para casa comprámos duas pizzas grandes, para comer quando chegássemos, mas cheiravam tão bem que não aguentámos levá-las mais que vinte metros, devorando-as mesmo ali, sentados na calçada.